Manejo do solo e o sequestro de carbono

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O correto manejo do solo vem ganhando importância quando o assunto é utilizar a terra de forma sustentável mantendo o equilíbrio ambiental. Para entender qual a importância que o manejo do solo tem na eficiência do sequestro de carbono para reduzir os efeitos danosos da emissão dos gases de efeito estufa (GEE) pela agricultura, precisamos entender como funcionam alguns temas, que são descritos na sequência.

O planeta Terra possui vários tipos de gases na composição da atmosfera; os quais são responsáveis, entre outros fatores, pelo equilíbrio e manutenção da temperatura na superfície terrestre possibilitando dessa forma o cultivo e uso do solo. Estes gases são responsáveis por absorver e emitir radiação infravermelha o que eleva a temperatura próxima da superfície da terra em média a 14°C, ocorrendo um efeito estufa natural. Este efeito estufa é crucial para a manutenção da vida na terra, pois sem ele a temperatura na terra seria em torno de -20°C.

Os gases responsáveis pelo efeito estufa (Figura 1) que emitem radiação infravermelha são: dióxido de carbono (CO2), metano (CH4), óxido nitroso (N2O) e ozônio (O3) sendo responsáveis pela elevação da temperatura (BALOTA,2017).

Figura 1- As atividades agrícolas que emitem GEE (CH4, N2O e CO2) e as emissões e remoções (CO2) por mudança de uso da terra e/ou manejo que alteram os estoques de carbono da biomassa e dos solos.

Fonte: Intergovernmental Panel on Climate Change.

Emissões de CH4
1) Cultivo de arroz
2) Fermentação entérica do gado
3) Manejo de dejetos animais
4) Queima de resíduos agrícolas

Emissões de N2O

5) Emissões diretas e indiretas por:
-Uso de fertilizantes orgânicos e inorgânicos,
-Deposição de dejetos animais em pastagens,
-Resíduos agrícolas
-Manejo de dejetos
6) Queima de resíduos agrícolas

Emissões de CO2
7) Mudança do estoque de carbono do solo
8) Mudança do estoque de carbono da biomassa viva e morta
9) Queima de biomassa

O grande problema em relação a estes gases é a elevação da quantidade dos mesmos na atmosfera, o que aumenta de forma demasiada a temperatura da superfície terrestre. Nos últimos 150 anos estima-se uma elevação da concentração de CO2 na atmosfera de 31%. As atividades agrícolas contribuem para a emissão destes gases, porém algumas práticas de manejo são capazes de reduzir a emissão de GEE e o solo pode contribuir para o sequestro de carbono.

Parte do CO2 emitido pelo solo é proveniente do processo de decomposição da matéria orgânica estimulado principalmente pelas práticas de revolvimento do solo associadas à retirada de cobertura vegetal. As emissões de N2O e CH4 do solo são reguladas também por processos microbiológicos. A matéria orgânica do solo é a principal fonte se carbono (Figura 2) para os microrganismos, porém, nem todo carbono da matéria orgânica é transformado em célula microbiana. Grande parte se perde sob forma de CO2 decorrente de sua mineralização (CUNHA et al., 2015). O acúmulo de carbono é determinado pelo balanço entre as perdas e ganhos de carbono no solo, onde a perda do carbono inclui processos como a erosão, decomposição, volatilização e lixiviação, ao passo que os processos que atuam no sequestro de carbono incluem mobilização, agregação, humificação e sedimentação (MACHADO et al., 2005).

Figura 2- Ciclo do carbono

Fonte: Embrapa

Práticas de manejo na agricultura podem reduzir a emissão de gases de efeito estufa, tais como: reduzir o uso de combustíveis fósseis, utilizar agricultura de precisão, maior racionamento no uso de fertilizantes e minimização do revolvimento do solo associado ao manejo das culturas que priorizem a produção de biomassa vegetal. Boas práticas agrícolas podem reduzir os estoques de carbono no solo, influenciando o seu armazenamento na matéria orgânica (BALOTA,2017). Assim práticas conservacionistas de manejo de solo são determinantes para que o mesmo possa funcionar como um dreno sequestrando o carbono da atmosfera.

O sistema de plantio direto SPD promove melhor estruturação do solo, melhor proteção física da matéria orgânica, bem como decomposição lenta e gradual dos resíduos orgânicos. Essas, entre outras propriedades, conferem ao SPD (Figura 3) a capacidade de aumentar os estoques de carbono no solo, reduzir a emissão de gases para atmosfera, em especial o CO2, resultando no acúmulo de carbono no solo. Se técnicas adequadas de uso e de manejo do solo forem adotadas (como Sistema de Plantio Direto SPD e integração lavoura-pecuária sob SPD), o setor agrícola assume características de dreno de CO2 atmosférico e, assim, pode atuar na mitigação dessas emissões. O solo é um compartimento-chave no processo de emissão de gases e no balanço total de carbono (CARVALHO et al., 2009).

Figura 3 – Comparação do carbono do solo sobre sistema convencional e sistema de plantio direto.

Fonte: Adaptada de LaborGene

A calagem é uma pratica utilizada em grande escala para a correção do pH do solo, que visa permitir e melhorar o estabelecimento das culturas e aumentar a absorção de nutrientes pelas plantas. Porém, esta prática pode contribuir para a emissão dos GEE. Os solos ácidos são produto do processo de sua formação, que se caracteriza pela alteração/decomposição do material de origem (minerais primários) e a formação de argilominerais e óxidos, causado, na sua essência, pela alta atividade do H+ em solução. A acidez torna o ambiente solo desfavorável ao crescimento radicular da maioria das espécies de interesse agropecuário, sendo apontado como um grande limitador de rendimento das culturas (DE QUÍMICA, CQFS-Comissão; DO SOLO, 2016). No entanto, a aplicação do calcário no solo é fonte de emissão de CO2, além de estimular a atividade microbiana do solo pela melhoria nas condições químicas do solo. O calcário quando o carbonato se dissolve, os cátions (Ca2+ e Mg2+) são trocados por íons de hidrogênio (H+), liberando bicarbonato (2HCO3), e assim formando CO2 e água (BALOTA,2017).

Sendo assim, para a recomendação da calagem deve-se ter a análise de solo do local, a escolha da cultura, o método de cultivo, as exigências nutricionais e a recomendação deve ser realizada de acordo com a realidade de todos esses fatores para que então a quantidade utilizada de calcário seja quimicamente aproveitada pelo solo e convertida satisfatoriamente pela cultura, reduzindo a quantidade de CO2 disponível na forma gasosa.

A adição de fertilizantes orgânicos afeta os componentes (físicos, químicos e biológicos) do solo, modifica a dinâmica de nutrientes e estimula a atividade biológica. Fertilizantes orgânicos possuem elevados teores de material orgânico, o que contribui tanto para o estimulo da atividade biológica, como para o acúmulo de carbono no solo.  Além disso favorece a agregação do solo, melhorando a sua estrutura, aeração, infiltração, drenagem e armazenamento de água. Mas para que esses fatores sejam satisfatórios dependem da continuidade e quantidade do uso da adubação orgânica e que o uso desses fertilizantes orgânicos esteja associado a práticas conservacionistas de manejo de solo (BALOTA, 2017).

O equilíbrio positivo entre a entrada e a saída de carbono em solos agricultáveis passa pela implementação de sistemas de produção fundamentados em princípios da agricultura conservacionista, pois o manejo adotado visa à manutenção permanente da cobertura do solo o que contribui para o incremento do conteúdo de carbono orgânico, para a reciclagem de nutrientes, a fixação simbiótica de nitrogênio, a retenção e a infiltração de água no solo, para a redução do escoamento superficial e o eficiente controle da erosão hídrica, fatores estes que resultam na melhoria da qualidade ambiental e na preservação dos recursos naturais (SANTI et al., 2007).

As taxas de sequestro de carbono podem apresentar variação, as quais podem crescer como diminuir significativamente devido às condições de clima e solo, manejo da cultura, bem como metodologia de amostragem e análises laboratoriais.  Apesar da perda de matéria orgânica no solo ser rápida, o ganho e acúmulo normalmente ocorrem de maneira lenta. Sendo assim, a elevação nos teores de matéria orgânica no solo está relacionada com o tempo de adoção da prática conservacionista (DE MORAES SA; LAL, 2009).

O Programa Agricultura de Baixo Carbono (ABC) tem por objetivo difundir práticas produtivas sustentáveis por meio de linhas específicas de crédito financeiro. O Brasil, na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (CQNUMC), foi o primeiro país a submeter um nível de referência de emissões no ano de 2009. Os compromissos apresentados basearam-se na redução do desmatamento, na adoção de práticas produtivas sustentáveis (integração produtiva, plantio direto, fixação biológica de nitrogênio), assim como na expansão da eficiência energética e do uso de biocombustíveis (SILVA & VIEIRA FILHO, 2020).

O Programa ABC ofereceu aos agricultores linhas de crédito diferenciadas, as quais totalizaram sete programas. As iniciativas propostas pelo Programa ABC podem começar a dar resultados mais contundentes com o aprendizado dos produtores e com o aperfeiçoamento da política. É necessário expandir o programa, ampliando o escopo regional e o número de beneficiários. Para tanto, deve-se reduzir a burocracia, além de facilitar o acesso às informações e ao crédito, tanto dos agentes financeiros quanto dos produtores (SILVA & VIEIRA FILHO, 2020).

Logo, tudo que foi visto nos mostra que a forma como é realizado o manejo do solo interfere na efetividade de sequestro de carbono pelo solo e na sua contribuição para redução do efeito estufa. Assim, as ferramentas de manejo como calagem, manutenção da matéria orgânica do solo, plantio direto, adição de fertilizantes orgânicos, as formas de uso do solo, e incentivo a políticas públicas, entre outros, se usadas preferencialmente em conjunto e de acordo com a realidade de cada solo, região e clima são fatores que contribuem com a eficiência no sequestro de carbono pelo solo contribuindo assim com a agricultura sustentável, reduzindo perdas ambientais ao longo do tempo.

Referências bibliográficas:

Agricultura Florestas e Uso do Solo (AFOLU, sigla em inglês) Disponível em: https://csr.ufmg.br/opcoesdemitigacao/o-setor-de-agricultura-florestas-e-outros-usos-do-solo.

BALOTA, Elcio Liborio. Manejo e qualidade biológica do solo. Londrina: Mecenas, 2017.

CARVALHO, João Luís Nunes; CERRI, Carlos Eduardo Pellegrino; CERRI, Carlos Clemente. SPD aumenta sequestro de carbono pelo solo. Visão agrícola, v. 9, p. 132-5, 2009.

CUNHA, T. J. F.; MENDES, Alessandra Monteiro Salviano; GIONGO, Vanderlise. Matéria orgânica do solo. 2015.

DE MORAES SA, Joao Carlos; LAL, Rattan. Stratification ratio of soil organic matter pools as an indicator of carbon sequestration in a tillage chronosequence on a Brazilian Oxisol. Soil and Tillage Research, v. 103, n. 1, p. 46-56, 2009.

DE QUÍMICA, CQFS-Comissão; DO SOLO, Fertilidade. Manual de calagem e adubação para os Estados de Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Viçosa, Sociedade Brasileira de Ciência do Solo. 376p, 2016.

EMBRAPA Disponível em: https://www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/noticia/34126519/plantio-direto-tem-potencial-para-sequestrar-carbono-na-producao-de-hortalicas  

MACHADO, P. L. O. de A. Carbono do solo e a mitigação da mudança climática global. Embrapa Solos, Rio de Janeiro, RJ. Quim. Nova, v. 28, n. 2, p. 329-334, 2005.

SANTI, Anderson; DALMAGO, Genei Antonio; DENARDIN, José Eloir. Potencial de seqüestro de Carbono pela agricultura brasileira e a mitigação do efeito estufa. 2007.

SILVA, Felipe Pinto da; VIEIRA FILHO, José Eustáquio Ribeiro. Avaliação de impacto do programa de agricultura de baixo carbono no Brasil. 2020.

Fonte:

Angélica Schmitz Heinzen – Eng. Agrônoma, DSc.

Carolina Custódio Pinto – Eng. Agrônoma, MSc.

Thiago Stella de Freitas – Eng. Agrônomo, MSc.

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